terça-feira, 8 de dezembro de 2009

Resumo

Se não acreditamos em predestinação, temos que admitir então que as circunstâncias de um encontro, que por comodidade atribuímos ao acaso, são, na verdade, o resultado de uma incalculável sequência de decisões tomadas em cada cruzamento de nossa vida e que, secretamente, nos levaram até ele. Não que tenhamos buscado, nem mesmo desejado, ainda que inconscientemente, todos os nossos encontros, até mesmo os mais importantes. O que acontece é que cada um de nós age como um artista ou um escritor que constrói sua obra numa sucessão de escolhas. Um gesto ou uma palavra não determina inelutavelmente o gesto ou a palavra seguinte; pelo contrário, coloca seu autor diante de uma nova escolha. Um pintor que colocou uma pincelada de vermelho pode escolher alongá-la, justapondo-lhe uma pincelada de roxo; pode escolher fazê-la vibrar com uma pincelada de verde. No final, por mais que ele tenha trabalhado com uma certa idéia do quadro pronto na cabeça, a soma de todas as decisões tomadas, sem que tenham sido previstas, fará surgir um outro resultado. É assim que vamos conduzindo nossa vida, num encadeamento de atos bem mais deliberados do que estamos prontos a admitir, porque assumir claramente toda essa responsabilidade seria um fardo muito pesado.

Mas é difícil, muitas vezes até dilacerante admitir o quanto suas decisões e atitudes interferem no curso de sua vida. Ter certeza é impossível e, convenhamos, seria muito fácil. Mas você sente e sabe. Aí está o problema...lidar com as consequências das suas escolhas. Mas você decidiu arriscar...você decidiu abrir mão. Você teve todas as oportunidades, e foi você quem escolheu dar as costas! Medo? Medo todos temos...mas às vezes simplesmente é tarde de mais.

domingo, 6 de dezembro de 2009

In me.

Sempre tive medo de cinco coisas. Do escuro. Não posso gostar de algo que me toma e me cega. Palhaços e gente vestida de bicho. Porque são simplesmente assustadores. Aranhas. Desde menina não confio em nada que tem mais de quatro patas. Bicho que não tem cor de bicho. Um elefante azul, por exemplo. Não é normal, entende. Elefantes são de um cinza chumbo. E criei certo receio, mas não medo, pelo mar depois de um incidente quase fatal com meu pai que tive o desprazer de assistir de camarote da areia, ainda pequena. Admiro, mas respeito. Aprendi que não se brinca com algo tão grande, tão forte e tão temperamental.
Hoje, todos eles que sempre foram tão grandes, parecem ínfimos com o que sinto em relação ao futuro. O medo do amanhã me desespera e me toma por completo sem deixar brecha para qualquer outro. Não há garantias porque, do ponto de vista do medo, ninguém é forte o suficiente. É desesperador imaginar que o que está me esperando na próxima esquina pode me magoar ou me salvar de vez.
O que me resta é gritar. Porque há o direito ao grito. Então eu grito. Grito porque sei que, mesmo a plenos pulmões, ninguém irá me ouvir. Grito porque tudo o que já virou banal e patético aos olhos dos outros ainda é grande para mim. Porque sou amor da cabeça aos pés, mas ele já foi posto à prova tanta vezes que tenho medo do que possa vir a acontecer. Com ele. Comigo.
Grito porque estou com raiva e meu peito dói. Grito porque eu quero que passe e ao mesmo tempo tenho medo de que passe realmente. Grito porque me sinto uma completa idiota frente a tudo que nego para mim mesma, mesmo sabendo...
Grito porque posso e não faço. Porque quero dizer, mas engulo. Tenho medo do futuro porque tudo ao meu redor muda o tempo todo e quando dou por mim, estou no mesmo lugar. Grito porque quero ficar, mas sei que não posso.
Grito porque quero ficar...
mas sei que não vou.

terça-feira, 10 de novembro de 2009

What's in my heart.

Embora.

Seu coração pulou do peito e decidiu fugir sem deixar vestígios. Tudo o que sobrou foi uma mistura de sentimentos que nem ela mesma sabia explicar. As lágrimas caiam sem licença, sem aviso. Brotavam incontrolavelmente dos olhos já vermelhos e inchados. Faltava-lhe o ar. As pernas tremiam, sem forças para manter-la em pé. As mãos geladas denunciavam um desespero impossível de se conter.
Seu mundo agora era de um cinza escuro, quase chumbo, e tinha o mesmo peso em suas costas. No armário as únicas lembranças do tempo em que mesmo triste ela estava feliz.
Acabou acreditando em ilusões que hoje vendam seus olhos para o sol que brilha lá fora. Um sol opaco e sem cor, mesmo no dia mais bonito.
Anda pela rua com um sorriso no rosto e os olhos marejados. A única denúncia de que guardava algo a sete chaves no peito apertado.
Hoje o travesseiro era seu único confidente.
Hoje ela só quer uma coisa...que passe.

segunda-feira, 26 de outubro de 2009

Sem nenhum ardil.

Já estive bem perdida, sem saber para onde ir, que direção tomar. Por um momento cheguei a pensar que tinha desaprendido a respirar. Queria muito e fazia tudo.
Hoje quero pouco. Faço tudo sem fazer nada. Procuro a felicidade em mim mesma. Não espero, não quero esperar. Sei que existe um mundo de possibilidades fora de mim, e, no final das contas, temos que tomar decisões. Eu entendo.
Olhar para trás já não vale mais a pena, a dor, a expectativa. Projeto minhas esperanças em um futuro que construo hoje, baseado em coisas e pessoas palpáveis e não em sonhos idealizados. Fumo um cigarro, leio um livro, ando pela rua em um dia ensolarado, tomo um copo bem gelado de Coca-Cola zero. Porque quero, porque gosto, porque me dá prazer.
Muita coisa já não faz mais sentido, já não cabe dentro de mim, e não é meu destilá-las por aí. Guardo a sete chaves tudo o que foi. Espero com um sorriso no rosto tudo o que ainda está por vir.
Não sou um ideal de perfeição, não sou um clichê, não gosto dessa idéia. Finalmente consigo reconhecer a projeção do espelho que a muito estava vazia. Pode parecer feia, um pouco esquálida e até meio embaçada aos olhos de quem vê e não enxerga...mas é clara como água aos olhos de quem sente de dentro para fora.
Não mudo, não preciso mudar. Evoluo. São coisas diferentes, entende? A concordância, em uma frase, faz toda diferença.
Na vida não importa o resultado final. O que importa é o caminho que você tomou para chegar até ele. Isso é o que vai determinar se o preto está no branco ou se o branco está no preto. Se é Monet ou Van Gogh, Saramago ou Lispector.
A beleza está no que se deixa para o outro. No que desponta em seu peito ao som de uma batida conhecida. Mesmo que seja passado. Mesmo que não importe mais.

Minha vida é poesia e música. E é isso que quero deixar marcado no coração de quem lembra de mim.

domingo, 4 de outubro de 2009

Let go.

Às vezes é necessário. Por mais que machuque, por mais difícil que seja, você tem que deixar passar. Um dia você abre os olhos e respira fundo, bem fundo. O ar entra cortando seus pulmões com cheiro de liberdade. Uma liberdade forçada. E vai doer, vai doer muito. Mas não é justo sentir sozinha.
Não é.



open mouth kisses
soda pop wishes
I'm sorry i drank so much
and was afraid of those dirty streets

i hope you find love
and grow a new center
let go, let go of hurt
let go, let go

when you walked out that door
it's like I froze
i got so tired of needing you
and hating myself, hating myself

I hope you find love
and grow a new center
let go, and let go of hurt
let go, let go

I finally put up those blinds
you know I took my time
i felt like dying there
so you'd have to say goodbye

and I hope you find love
and grow a new center
let go, and let go of hurt
let go, let go

and let go of hurt
let go, let go

quarta-feira, 30 de setembro de 2009

Qualquer semelhança é mera coincidência!

"A ti Escorpião, darei uma tarefa muito difícil. Terás a habilidade de conhecer a mente dos homens, mas não te darei a permissão de falar sobre o que aprenderes. Muitas vezes te sentirás ferido por aquilo que vês, e em tua dor te voltarás contra Mim, esquecendo que não sou Eu, mas a perversão de Minha Idéia, o que te faz sofrer. Verás tanto e tanto do homem enquanto animal, e lutarás tanto com os instintos em ti mesmo, que perderás o teu caminho; mas quando finalmente voltares, terei para ti o Dom supremo da Finalidade."
E Escorpião retornou ao seu lugar.
(Original de Martin Schulman – Karmic Astrology: The Moon's Nodes and
Reincarnation, 1977)

Escorpião é simbolizado por dois animais: a águia e o próprio escorpião. Ambos são animais solitários e que necessitam de perspicácia para sobreviver.

O escorpião é um dos animais mais resistentes que se conhece. Ele pode passar sem se alimentar por dias e sobrevive em paisagens quase que insuportavelmente quentes. É, também, o único animal que ao ficar cercado, acuado e sem saída, irá ferroar-se a si próprio. Ao contrário do que se imagina, o escorpião não ataca outros animais. Na verdade, ele só ataca quando é pisado ou provocado.

Tudo isso fala muito a respeito da psicologia de um escorpiano. Mais, ainda assim, temos que retornar ao seu próprio mito pessoal. O escorpiano nasce em meio a uma crise. Não importa que crise - um avô pode ter recentemente falecido, alguém pode estar gravemente doente ou pode ter havido algum tipo de perda. Escorpianos nunca nascem em um momento tranqüilo. O momento em que um escorpiano nasce é sempre um momento decisivo, irreversível e transformador.

Não se sabe por quê, mas mesmo os escorpianos mais amados sentem-se rejeitados. É compreensível, por exemplo, que ao nascer enquanto a família vivia o luto de algum parente, ele sinta que não seja bem vindo, não por ele mesmo, e sim pelo momento. Mas o escorpiano, a princípio, é incapaz de fazer essa distinção. Ele acha que ele é o responsável por esse momento ruim, que ele trouxe essa desgraça ou que ele não deveria 'ter vindo'. É bom lembrar que o dia de Finados ocorre enquanto o Sol está em Escorpião.

A criança escorpiana é ligada a mãe. Ela experimenta, em relação a mãe, sentimentos conflitantes. Sente um amor profundo, mas subsiste também o ódio de ter sido 'rejeitada' (mesmo que não seja verdade!). Aliás, ela não consegue ser 'neutra' em relação a mãe. Ou ela a ama com todas as forças, ou odeia, ou vai do amor ao ódio com grande facilidade. A mãe, para um escorpiano, não é uma mulher qualquer. Ela é a um só tempo forte, reservada e dominadora. Ela tem uma força silenciosa que irá transmitir a criança. Essa força poderá ser positiva ou negativa.

O pai do escorpiano não é uma figura afável. Ele pode ser distante ou autoritário. O escorpiano não sente que será tratado 'a pão de ló' por ele. Muito pelo contrário, seu pai é uma pessoa exigente. O escorpiano poderá admirar isso ou sentir-se profundamente rejeitado.

Por esse histórico, não é de se espantar que o escorpiano seja uma criatura intensa.

Escorpião é um signo altamente emocional. Ele é tão emotivo quanto o canceriano e o pisciano, mas o escorpiano procura esconder isso. Ele sabe que no momento em que a sua vulnerabilidade for revelada ele poderá ser ferido. Na verdade, ele só revela a sua face mais frágil quando sente absoluta confiança, e mesmo assim ele não o faz por muito tempo, porque por natureza o escorpiano não gosta de se expor.

E a respeito da sexualidade, questão sempre ligada a Escorpião? Escorpião é um signo da Água e também um signo Fixo. É essa fixidez que lhe dá essa natureza profundamente emocional, e o sexo é o mais perfeito canal para dar vazão a tantos sentimentos. É na sexualidade que o Escorpiano se revela. É imensa a importância do sexo para o escorpiano. Eles vivem sem tudo, menos sem sexo. O sexo é o próprio 'eu' do escorpiano.

Os escorpianos que nascem nas horas grandes - meia noite, meio dia - e no primeiro decanato, são os mais passivos possíveis mas, ao mesmo tempo, os mais intensos. Pela hora e momento de nascimento, esses são os que menos adquirem defeitos típicos de escorpianos. Não são nada vingativos, nada agressivos e tornam-se pessoas extremamente justas e amorosas. São fortemente inspirados pelas suas emoções, mas se transformam e tornam-se senhores dela. O Escorpião conhece a rejeição, e a rejeição é o sentimento mais doído que existe, daí a sua capacidade de ajudar aos outros. São pessoas que se doam e se preocupam genuinamente com os problemas alheios. Os escorpianos não pedem ajuda e sempre resolvem o problema. São extremamente fiéis, leais e justos.

Ter um escorpiano em sua vida é uma dádiva incrível. Eles possuem tanta energia que são capazes que sustentar e elevar a pessoa mais baixa e menos enérgica. Nem que isso custe a sua própria energia.

É impossível ficar indiferente à presença de um escorpiano. Ele deixa um marca tão profunda que é impossível se esquecer. Se você possui um escorpiano em sua vida, provavelmente ele tem uma importância imensa. Não traia, não minta, não o perca. Você irá se arrepender.

A missão do escorpiano não é eliminar seus sentimentos. Seus sentimentos formam um rico caldo de experiências. Muitos escorpianos são místicos, buscam o mistério da vida. O sentimento é o que os impele. A missão do escorpiano é transformar seus sentimentos. O escorpiano precisa mudar a si mesmo ao invés de voltar a sua poderosa energia para os outros.

O escorpiano passa por radicais transformações de personalidade ao longo de sua vida. Sua vida vai se tornando mais fascinante à medida que ele vai compreendendo os seus sentimentos e a sua missão. Ele tem uma forte energia que precisa ser canalizada. É como a energia nuclear: bem utilizada ela gera muitos benefícios. Todos os escorpianos são de alguma maneira 'radioativos'. Eles não podem ficar indiferentes a isso. Ou eles se desenvolvem, melhoram a si mesmo e ao mundo imediato que os cerca ou destroem. Não existe meio-termo.

Nós falamos sobre a águia. A águia mais conhecida é a Fênix, aquela que renasceu das cinzas. Os escorpianos precisam 'queimar' sentimentos primitivos, como o ódio, a rejeição ou a solidão profunda – para poderem se transformar e 'renascer', e assim cumprirem a missão a que foram destinados: deixar uma incrível marca em tudo e todos que os cercam.

quinta-feira, 24 de setembro de 2009

Chico...ahhhh, Chico!





"Já lhe dei meu corpo
Minha alegria
Já estanquei meu sangue
Quando fervia
Olha a voz que me resta
Olha a veia que salta
Olha a gota que falta
Pro desfecho da festa
Por favor...

Deixe em paz meu coração
Que ele é um pote até aqui de mágoa
E qualquer desatenção, faça não
Pode ser a gota d'água...

Já lhe dei meu corpo
Minha alegria
Já estanquei meu sangue
Quando fervia
Olha a voz que me resta
Olha a veia que salta
Olha a gota que falta
Pro desfecho da festa
Por favor...

Deixe em paz meu coração
Que ele é um pote até aqui de mágoa
E qualquer desatenção, faça não
Pode ser a gota d'água

Pode ser a gota d'água

Pode ser a gota d'água..."

quarta-feira, 23 de setembro de 2009

Cansei!

Lembro saudosa do tempo em que as pessoas prezavam pela privacidade, se contentavam em dividir sua vida apenas com quem de fato participasse dela e, melhor ainda, se contentavam em viver as próprias vidas.

Ter orkut era legal quando eu tinha 15 anos e uma cabeça bem menos madura. Ver minha vida exposta como livro em estante de biblioteca não é mais tão apelativo assim.
Todo mundo toma conta da vida de todo mundo. Todos nós damos uma olhadinha safada nas atualizações dos nossos "amigos" só para saber o que está acontecendo na vida deles. Que mal há em dar uma fuxicada, não é mesmo? Porque fugir da realidade é muito bom. Porque saber que o coleguinha do lado terminou o namoro, foi despedido ou brigou com o melhor amigo é consolador. É sempre tão mais fácil lidar com os problemas alheios do que encarar os nossos...
Tudo no orkut toma uma proporção absurda, e eu nunca vi pessoa nesse mundo que conseguisse criar boatos e intrigas tão bem quanto aquela inocente página virtual. Quando você percebe, seu vício por Coca-Cola Zero virou doença e, agora, você têm um castelinho de garrafas pet no quartinho dos fundos. E tenho certeza que, à essa altura, os fabricantes de porta-retratos estão completamente desesperados!
Nós, que somos tão cultos e letrados, que adoramos discutir a Revolução Francesa, nos tornamos completos imbecis ao acompanhar de camarote a novela da vida alheia. Sem pudor. Sem freios.
Quando foi que decidimos abdicar de nossa privacidade tão facilmente? Em que ponto decidimos deixar que nossas vidas se tornassem revistas virtuais de fofocas e, de alguma maneira doente, nos divertimos com isso?

Percebi o quanto gosto da minha privacidade. E estou tomando ela para mim mais uma vez.

terça-feira, 22 de setembro de 2009

Um dia, quem sabe.

Eu espero um mundo melhor, com pessoas melhores e idéias mais claras. Eu espero um dia entender tudo o que hoje me perturba e fazer de tudo de ruim que me cerca apenas inconstâncias ultrapassadas.
Espero o dia em que as pessoas entendam que nós mudamos sim, mas nosso caráter não. Você nasce uma tela em branco e não demora muito até preencher os vazios.
Quero poder ver inocência e não malícia. Quero poder confiar, sem restrições, em quem me oferece lealdade. Porque enxergo a alma e não me deixo intimidar pela barreira dos olhos.
Um dia espero entender os caminhos tortos por onde andei para, quem sabe, poder finalmente conhecer o plano torto que tenho reservado, com meu nome gravado em pedra, desde o dia em que nasci.

Eu tenho esperança. E se a esperança é a última que morre, quero morrer junto dela, velha e esperançosa, até o último dos meus dias.

quinta-feira, 3 de setembro de 2009

Além do que se vê.

Todos dormiam menos ela.
No relógio, vinte e três horas e vinte e seis minutos.
Há quanto tempo não arriscava?
Há muito tempo...

Riu de si mesma enquanto andava pela rua com um sorriso torto estampado no rosto. Sentia-se aquela adolescente faceira mais uma vez.
O vento batia com força nas janelas dos prédio ao redor, forçando sua entrada pelo vidro grosso. Ele queria entrar. As árvores dançavam, calmas. Respirou fundo.
"É incrível o rumo que as coisas podem tomar. Hum. Quente noite de inverno. Contraditório". Mas o que não era contraditório nos últimos tempos? Confusão emocional, pílulas para isso, pílulas para aquilo.
Estava farta dessa vida medíocre que criara para si mesma. "Culpada de todas as acusações, meretíssimo!"
Estava calma, serena. Os pés no chão. A mente clara. Tudo fazia sentido naquela noite. "Os dias que me vejo só são dias que eu me encontro mais. Eu devia mesmo prestar mais atenção ao que ouço".
As luzes da rua a acompanhavam nessa caminhada em direção à descoberta. Dela mesma. De tudo o que tinha abandonado por livre e estúpida vontade. Era como se o vendo trouxesse as respostas. Fácil assim. Porque, na verdade, não era difícil, era doloroso. São coisas completamente diferentes. Ela sabia o que fazer. Se não soubesse, não estaria sofrendo.
Comodismo. Costume. Se acostumou com a dor. Sentia-se viva acompanhada dela. Mas ali, naquela esquina, naquela noite, nada doía, e ela nunca se sentiu tão viva em toda sua vida."Vamos queimar mais algumas células, shall we?"
Acendeu o cigarro de filtro vermelho. A fumaça invadia seus pulmões quase como água para o sedento."Ahhh...agora sim!"
Parou para encarar seu reflexo na vitrine de uma dessas grandes lojas de departamentos. Grades protegiam os vidros. Era assim que se sentia. Um animal selvagem preso em uma jaula. Até agora.
O vento voltou a soprar. Algo aos seu pés chamou sua atenção. Abaixou-se para pegar o papel sujo e amassado que, de alguma forma, ficou preso em sua calça. Era um daqueles panfletos baratos de Santos. Na frente, a imagem de Santa Bárbara, a Santa guerreira. Atrás, uma oração em sua homenagem. "Santa Bárbara, que sois mais forte que as torres das fortalezas e a violência dos furacões, fazei que os raios não me atinjam, os trovões não me assustem e o troar dos canhões não me abale a coragem e a bravura. Ficai sempre ao meu lado para que eu possa enfrentar de fronte erguida e de rosto sereno todas as tempestades e as batalhas de minha vida, para que, vencedor de todas as lutas, com a consciência do dever cumprido, possa agradecer a vós, minha protetora, e render graças a Deus, criador do céu, da terra, da natureza: este Deus que tem poder de dominar o furor das tempestades e abrandar a crueldade das guerras. Santa Bárbara, rogai por nós!" Leu em voz alta. Olhou para os lados. A rua, tão movimentada durante o dia, agora estava completamente deserta.
Voltou para casa. Com ela, o vento soprando, a Santa no bolso e um sorriso no rosto.
E a felicidade.
Ah, sim. A felicidade que a inundava. Olhou para o peito com a mão sobre o coração.
"Onde você estava?" A resposta veio na mesma hora. "Aí dentro. O tempo todo."

quinta-feira, 27 de agosto de 2009

Agora.

Ela não sabia muito bem como seria daqui para frente. Estava escuro, e isso a assustava. Suas mãos estavam geladas, mas não estava frio.

Já passava da meia noite, ela estava sentada à janela, um copo na mão e o cigarro em outra. Na cabeça tudo, menos dúvida, menos indecisão. Não agora.

Sabia que tentaria, mais uma vez, se fosse possível. E era...para ela...e só para ela...de um jeito que só ela entendia. Talvez fosse demais, ou talvez não fosse o suficiente. Vai saber.

quarta-feira, 26 de agosto de 2009

Desta vez.

Ainda estava escuro quando Pedro abriu os olhos. Esticou os braços para o lado procurando o corpo de Teresa, mas encontrou um vazio.
Levantou, atravessou o escritório, olhou para a cozinha e parou na sala de estar. Desnorteado, começou a chamar pelo seu nome. Nada ouvia. Voltou ao quarto e percebeu um embrulho branco encima do travesseiro, no canto da cama. Abriu o envelope com calma e correu os olhos pela caligrafia torta, já conhecida.

“ A partir de hoje você não sabe meu nome. A partir de hoje você vai esquecer meu corpo, vai esquecer que já provou meu beijo. A partir de hoje eu não sou mais sua. Depois de tanto tempo e tantas tentativas que esgotaram meu corpo e alma, estou partindo. Não desse lugar, não desse mundo, mas de você. É tudo muito grande para mim, grande demais para caber no pequeno peito cheio de ossos e já esticado como mola, para todos os lados do meu ser. Para tentar caber. O amor e a dor, ambos imensos e que não encontram mais lugar em mim.
Eu sou menina, uma criança. Acredito em contos de fada, em cavalos brancos. Mas você é homem feito, mais velho, cheio de experiências, idéias, certo do que quer, que não nega nada e arrisca tudo. Arriscou tanto que acabou me perdendo. Eu sonho. Sonho até demais. Mas você não conhece a ingenuidade de um sonho. Prefere acreditar na metafísica do que em meus devaneios infantis sobre amor eterno.
A comida está no fogo e sua cama nunca ficará vazia. Você não precisa mais de mim. Mas eu preciso de você. Do seu todo e não desses pedaços de atenção jogados ao vento, divididos, confusos e imperativos.
Você escolheu um caminho, não posso contestar, mas não preciso aceitar. Não quero mais você dentro de mim, não desse jeito. Não posso mais me render ao que sinto, me rendo tanto todo dia que acabei me prendendo em uma teia de sentimentos que vão muito além da minha capacidade de sentir.
Você fez sua escolha.
Você tem tudo...
e você não precisa mais de mim.



Adeus,

T.”


Pedro leu cada linha com a certeza de que, desta vez, era real.
Dobrou o papel com cuidado e deitou-se, com um única lágrima solitária escorrendo pelo rosto.

segunda-feira, 17 de agosto de 2009

Que coisa é essa de sentir?

Que coisa é essa de sentir? Sentimos tudo, frio, calor, fome, saudade, tesão. Somos máquinas de hormônios prontos para agarrar qualquer coisa que instigue nossos sentidos, que desperte nossa curiosidade. Somos movidos pelo desejo, desejo de ter, de provar, de sentir.

Ignoramos todos os estudos de Aristóteles onde a razão predomina. Passamos batidos pela teoria de Platão sobre apenas contemplar. Buscamos a felicidade em instantes, e não em sua plenitude.

Somos momentaneamente felizes e constantemente incompletos. Os mais idealistas falam em enxergar longe, o horizonte. O horizonte é apenas onde seus olhos repousam, mais nada. O que muda de pessoa para pessoa é o que se enxerga. Onde seus desejos e anseios estão. Mas nós somos complexos (ou até mesmo burros) de mais para saber o que queremos. Estamos sempre insatisfeitos, sempre em uma busca desenfreada, procurando qualquer faísca de excitação que, no fim, se apaga, como todas as outras.

Quando tudo faz sentido, quando tudo dá certo, procuramos qualquer vestígio de erro, olhamos para o lado, desconfiados. Porque quando está tudo bem, damos um jeito de estragar, só para poder consertar...ou simplesmente porque, bem, no final, não era bem isso que queríamos.

E sentir é chato. Incomoda, dói, ás vezes até coça. Bagunça a mente, bagunça a alma, contradiz tudo o que sai da boca, renega todo o racional, manda para o espaço horas solitárias de auto-análise e te destrói em mil pedaçinhos.

Porque nada nunca é o suficiente. Porque queremos tudo e acabamos sem nada.

quinta-feira, 13 de agosto de 2009

Estamos indo de volta pra casa.

Sempre que vou a Curitiba me bate um certo desespero...e ele vem por etapas.
É muito conflitante estar de volta ao lugar que tive que abandonar com tanta relutância...revirar o passado. É muito doloroso deixar o lugar ao qual tive que lutar muito para me adaptar e que hoje amo com todo coração.

O mais reconfortante é estar no céu...nem lá, nem cá.


"Eu amo tudo o que foi,
Tudo o que já não é,
A dor que já me não dói,
A antiga e errônea fé,
O ontem que dor deixou,
O que deixou alegria
Só porque foi, e voou
E hoje é já outro dia."

Fernando Pessoa.

domingo, 9 de agosto de 2009

De repente

"Sou um móbile solto no furacão.

Qualquer calmaria me dá...




...solidão".


Eu estava fuxicando meu computador e me deparei com um texto inacabado que começei a escrever aos 15 anos, em meus primeiros meses de Rio de Janeiro.
Fiquei nostálgica e resolvi postar.


"Ela andava pelas ruas e não reconhecia nada. O asfalto, o cheiro, as pessoas. Até o céu estava diferente. Todo dia se levantava e desejava acordar lá, bem longe, no lugar que ela conhecia. Os olhos que antes brilhavam de alegria, agora regavam com lágrimas o chão, denunciando seus passos tímidos. Nada mais fazia sentido, tudo que enxergava era um grande borrão, imagens distorcidas que para ela não faziam sentido. Um dia, no meio da noite, olhando para o céu estrelado, ela fez um pedido. Pediu para que a dor sumisse, para que o aperto em seu coração passasse, para que libertassem as borboletas presas em seu estômago.
Acordou com o sol iluminando seu rosto molhado. Respirou fundo e sentiu um cheiro novo pairando no ar. Tudo estava mais nítido e foi aqui que ela percebeu..."

quarta-feira, 29 de julho de 2009

Lá vem o barco.

Sou a mesma...desde o dia em que nasci. Gosto do que sempre gostei, não gosto do que nunca me agradou. Meu caráter é o mesmo, meus conceitos, opiniões e verdades. Cresci, amadureci, mas não mudei.
Em uma coisa nunca fui muito boa: tomar decisões. Desde a cor da blusa que vestiria até a profissão que iria seguir. Lembro de minha adolescência problemática e grunge onde tudo em meu guarda-roupa era preto, xadrez ou com estampa de banda e ainda assim me demorava para escolher a combinação.
Até hoje isso é um grande problema. O negócio é que, quando crescemos, as decisões tendem a ser mais difíceis, implicam em consequências que nos atingem em níveis mais complexos e não apenas em que roqueiro vai estar estampado no peito.
Não gosto dessa brincadeira de ter que decidir, de ter que escolher entre o que quero e entre o que devo fazer.
O caminho certo nem sempre é o mais fácil, o que mais me agrada, sei que não posso e que, no final, vou sair machucada. É sempre assim. Conheço a estrada e não é de hoje...passei por ela tantas vezes...fui....voltei para catar os pedaços...sei exatamente como vai ser. É nesse momento que ela me espera, sorrateira, encolhida em um canto para, na hora certa, se postar na minha frente com ar de superioridade e dizer: "Está na hora. Escolhe." Tento desesperadamente recorrer à minha inteligência, à minha maturidade, mas minha mente tem um tendência um tanto quanto irritante de se submeter ao meu coração e de ignorar totalmente a racionalidade da coisa. Porque sim, você sabe que não pode comer aquele pedaço de torta, afinal, está em uma dieta rigorosíssima há meses...o que você faz? Não come aquele pedaço de torta, afinal, só você sabe o quanto sofreu para chegar até ali, certo? Errado! Você não só como aquele pedaço como vai até a confeitaria da esquina, compra um torta inteira e aproveita cada segundo dos dois minutos que você leva para devorar o que seria o suficiente para satisfazer oito pessoas. Depois bate o desespero, o arrependimento e você jura, por tudo o que é mais sagrado, que nunca mais vai colocar um doce na boca.
Na próxima semana está lá você, chorando, com o garfo na mão, prometendo o impossível mais um vez.

sábado, 25 de julho de 2009

Ai, minhas costas!

Foi um sábado normal, como qualquer outro, pelo menos para mim. Almocei, joguei cartas, preparei um cheesecake de goiabada e fiquei na sala com meus pais, ouvindo histórias de casamento, família, rindo de tragédias, aquela coisa toda. O interfone até tocou uma vez e lá foi minha mãe com a frase mais que pronta: "Não, não! Está tudo bem. Ninguém está brigando, Meu Deus! Só estamos conversando. Não precisa chamar a polícia!".
Depois de um dia agradável, meus pais decidiram sair. Oba! A casa só para mim!!!
A primeira coisa que me veio à mente foi: "Estou com fome". Mas isso já era de se esperar. Fui até a cozinha preparar um macarrão à carbonara, ignorando toda a dor de estômago que sentia a dias. Ah! Dane-se!!! Enquanto a massa fervia, aproveitei para tomar um banho. Servi uma taça de vinho branco, tomei um comprimido de omeprazol (estômago fraco, sabe) coloquei no som minha compilação mais que perfeita de Frank Sinatra e me demorei embaixo da água quente, com Frank e Chico (meu passarinho cult que se amarra em Sinatra) embalando minha noite solitária de sábado. Me despedi da água quente com certa relutância e disparei para o roupão branco de algodão fofinho.
Demorei um pouco demais, a massa passou do ponto...mas o molho estava delicisoso. Sentei no sofá e eu, Chico, meu canário cult, e Kevin, meu gato maluco, nos fazíamos companhia. Ah, claro...e Frank...ele é muito importante...sempre.
Acendi um cigarro e me deparei com a cena de alguém me preguntando, assim, casualmente:
"-Então, o que fez no fim de semana?
-Ah, bem...sexta-feira eu dormi cedo. No sábado joguei carta com meus pais, preparei um cheesecake, fiz um macarrão à carbonara que estava daqui, ó! Depois passei a noite ouvindo Frank Sinatra, tomando vinho branco e assinto Casablanca e Dr.Zhivago.
-Hmmm...tá!!!"

Não...eu não sou uma menina comum de vinte anos. E não me venha dizer que elas não estão por aí na night, enchendo a cara, se acabando de dançar e pegando geral, porque sim, elas estão. Mas tenho uma alma velha e um pouco chata, muitas vezes. Gosto de casa, família, bicho, filme e cobertor. Carinho, debate, conversa existencial. É essa velhice precoce que me atinge.
Não...eu não sou uma menina comum de vinte anos...e gosto de não ser. Me preocupo demais, analiso demais, espero muito de mim mesma, mesmo sabendo que não é hora, que não tem razão. Sim...eu leio livros de história, ouço B.B King, cozinho pratos elaborados só para mim e passo o sábado a noite em casa, sozinha, tomando vinho e assistindo filmes mais velhos do que minha própria existência.
Talvez algum dia alguém goste disso em mim tanto quanto eu...e meus pais. Ah, sim! Eles dão graças.

sexta-feira, 24 de julho de 2009

What's in my mind

Fim.

Ela acordou, lavou o rosto, escovou os dentes, serviu uma caneca de café bem quente com pouco açúcar e ligou a televisão no programa das onze, tudo como sempre fazia. Sentou-se na poltrona, de lado, sobre as pernas dobradas, com o velho casaco xadrez que a esquenta todas as manhãs. Sentia um frio agudo, daquele que machuca os ossos, e até pensou em voltar para a cama, se encolher no cobertor pesado e dormir um pouco mais. Parecia uma boa idéia. Nos últimos tempos sua cama era seu refúgio, ali nada a atingia.
Levantou da poltrona e foi até a cozinha, completar a caneca de café que já estava pela metade. Tem agonia de coisas incompletas. Sentia-se pesada, o que era comum ultimamente e não a agradava nem um pouco. Era como se grilhões invisíveis estivessem presos aos seus pés e braços. Olhou para baixo na esperança de vê-los. Esperança mesmo. Lidar com coisas materiais é tão mais fácil. Iria até a loja de ferramentas da esquina, imaginou, carregando seus grilhões, e pediria ao homem que trabalhava com as vigas de ferro: “Moço, será que o senhor poderia tirar esses negócios de mim? Não sei como eles foram para aí, não. Mas são muito pesados, sabe, acho que não estão fazendo bem para minha coluna e nem para minha cabeça. Minhas costas doem demais e estou ficando meio maluca.” Riu de si mesma, mas ainda assim queria que fosse verdade.
Caminhou até a porta do quarto e deu uma boa olhada. Lá estava ela, tão quente, tão convidativa. Sua cama era uma resposta muito fácil, tudo o que ela queria. Procurou pela luz que esquentava seu rosto. Não tinha reparado em como o dia estava bonito. Não reparava mais em nada ultimamente. O frio que cortava seu rosto foi amenizado pelo sol intenso que brilhava em um céu limpo. Lembrou de sua avó. Ela chamava de céu de brigadeiro quando ele estava assim, sem nuvens, de um azul intenso e tranqüilizador. Sentia uma mistura de desespero e êxtase. Decidiu arriscar. Largou a caneca sem se preocupar com a marca que deixaria no móvel branco, vestiu um velho agasalho e saiu porta afora, desta vez, sem olhar para trás.