quarta-feira, 29 de julho de 2009

Lá vem o barco.

Sou a mesma...desde o dia em que nasci. Gosto do que sempre gostei, não gosto do que nunca me agradou. Meu caráter é o mesmo, meus conceitos, opiniões e verdades. Cresci, amadureci, mas não mudei.
Em uma coisa nunca fui muito boa: tomar decisões. Desde a cor da blusa que vestiria até a profissão que iria seguir. Lembro de minha adolescência problemática e grunge onde tudo em meu guarda-roupa era preto, xadrez ou com estampa de banda e ainda assim me demorava para escolher a combinação.
Até hoje isso é um grande problema. O negócio é que, quando crescemos, as decisões tendem a ser mais difíceis, implicam em consequências que nos atingem em níveis mais complexos e não apenas em que roqueiro vai estar estampado no peito.
Não gosto dessa brincadeira de ter que decidir, de ter que escolher entre o que quero e entre o que devo fazer.
O caminho certo nem sempre é o mais fácil, o que mais me agrada, sei que não posso e que, no final, vou sair machucada. É sempre assim. Conheço a estrada e não é de hoje...passei por ela tantas vezes...fui....voltei para catar os pedaços...sei exatamente como vai ser. É nesse momento que ela me espera, sorrateira, encolhida em um canto para, na hora certa, se postar na minha frente com ar de superioridade e dizer: "Está na hora. Escolhe." Tento desesperadamente recorrer à minha inteligência, à minha maturidade, mas minha mente tem um tendência um tanto quanto irritante de se submeter ao meu coração e de ignorar totalmente a racionalidade da coisa. Porque sim, você sabe que não pode comer aquele pedaço de torta, afinal, está em uma dieta rigorosíssima há meses...o que você faz? Não come aquele pedaço de torta, afinal, só você sabe o quanto sofreu para chegar até ali, certo? Errado! Você não só como aquele pedaço como vai até a confeitaria da esquina, compra um torta inteira e aproveita cada segundo dos dois minutos que você leva para devorar o que seria o suficiente para satisfazer oito pessoas. Depois bate o desespero, o arrependimento e você jura, por tudo o que é mais sagrado, que nunca mais vai colocar um doce na boca.
Na próxima semana está lá você, chorando, com o garfo na mão, prometendo o impossível mais um vez.

sábado, 25 de julho de 2009

Ai, minhas costas!

Foi um sábado normal, como qualquer outro, pelo menos para mim. Almocei, joguei cartas, preparei um cheesecake de goiabada e fiquei na sala com meus pais, ouvindo histórias de casamento, família, rindo de tragédias, aquela coisa toda. O interfone até tocou uma vez e lá foi minha mãe com a frase mais que pronta: "Não, não! Está tudo bem. Ninguém está brigando, Meu Deus! Só estamos conversando. Não precisa chamar a polícia!".
Depois de um dia agradável, meus pais decidiram sair. Oba! A casa só para mim!!!
A primeira coisa que me veio à mente foi: "Estou com fome". Mas isso já era de se esperar. Fui até a cozinha preparar um macarrão à carbonara, ignorando toda a dor de estômago que sentia a dias. Ah! Dane-se!!! Enquanto a massa fervia, aproveitei para tomar um banho. Servi uma taça de vinho branco, tomei um comprimido de omeprazol (estômago fraco, sabe) coloquei no som minha compilação mais que perfeita de Frank Sinatra e me demorei embaixo da água quente, com Frank e Chico (meu passarinho cult que se amarra em Sinatra) embalando minha noite solitária de sábado. Me despedi da água quente com certa relutância e disparei para o roupão branco de algodão fofinho.
Demorei um pouco demais, a massa passou do ponto...mas o molho estava delicisoso. Sentei no sofá e eu, Chico, meu canário cult, e Kevin, meu gato maluco, nos fazíamos companhia. Ah, claro...e Frank...ele é muito importante...sempre.
Acendi um cigarro e me deparei com a cena de alguém me preguntando, assim, casualmente:
"-Então, o que fez no fim de semana?
-Ah, bem...sexta-feira eu dormi cedo. No sábado joguei carta com meus pais, preparei um cheesecake, fiz um macarrão à carbonara que estava daqui, ó! Depois passei a noite ouvindo Frank Sinatra, tomando vinho branco e assinto Casablanca e Dr.Zhivago.
-Hmmm...tá!!!"

Não...eu não sou uma menina comum de vinte anos. E não me venha dizer que elas não estão por aí na night, enchendo a cara, se acabando de dançar e pegando geral, porque sim, elas estão. Mas tenho uma alma velha e um pouco chata, muitas vezes. Gosto de casa, família, bicho, filme e cobertor. Carinho, debate, conversa existencial. É essa velhice precoce que me atinge.
Não...eu não sou uma menina comum de vinte anos...e gosto de não ser. Me preocupo demais, analiso demais, espero muito de mim mesma, mesmo sabendo que não é hora, que não tem razão. Sim...eu leio livros de história, ouço B.B King, cozinho pratos elaborados só para mim e passo o sábado a noite em casa, sozinha, tomando vinho e assistindo filmes mais velhos do que minha própria existência.
Talvez algum dia alguém goste disso em mim tanto quanto eu...e meus pais. Ah, sim! Eles dão graças.

sexta-feira, 24 de julho de 2009

What's in my mind

Fim.

Ela acordou, lavou o rosto, escovou os dentes, serviu uma caneca de café bem quente com pouco açúcar e ligou a televisão no programa das onze, tudo como sempre fazia. Sentou-se na poltrona, de lado, sobre as pernas dobradas, com o velho casaco xadrez que a esquenta todas as manhãs. Sentia um frio agudo, daquele que machuca os ossos, e até pensou em voltar para a cama, se encolher no cobertor pesado e dormir um pouco mais. Parecia uma boa idéia. Nos últimos tempos sua cama era seu refúgio, ali nada a atingia.
Levantou da poltrona e foi até a cozinha, completar a caneca de café que já estava pela metade. Tem agonia de coisas incompletas. Sentia-se pesada, o que era comum ultimamente e não a agradava nem um pouco. Era como se grilhões invisíveis estivessem presos aos seus pés e braços. Olhou para baixo na esperança de vê-los. Esperança mesmo. Lidar com coisas materiais é tão mais fácil. Iria até a loja de ferramentas da esquina, imaginou, carregando seus grilhões, e pediria ao homem que trabalhava com as vigas de ferro: “Moço, será que o senhor poderia tirar esses negócios de mim? Não sei como eles foram para aí, não. Mas são muito pesados, sabe, acho que não estão fazendo bem para minha coluna e nem para minha cabeça. Minhas costas doem demais e estou ficando meio maluca.” Riu de si mesma, mas ainda assim queria que fosse verdade.
Caminhou até a porta do quarto e deu uma boa olhada. Lá estava ela, tão quente, tão convidativa. Sua cama era uma resposta muito fácil, tudo o que ela queria. Procurou pela luz que esquentava seu rosto. Não tinha reparado em como o dia estava bonito. Não reparava mais em nada ultimamente. O frio que cortava seu rosto foi amenizado pelo sol intenso que brilhava em um céu limpo. Lembrou de sua avó. Ela chamava de céu de brigadeiro quando ele estava assim, sem nuvens, de um azul intenso e tranqüilizador. Sentia uma mistura de desespero e êxtase. Decidiu arriscar. Largou a caneca sem se preocupar com a marca que deixaria no móvel branco, vestiu um velho agasalho e saiu porta afora, desta vez, sem olhar para trás.